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O INCONSCIENTE ESTRUTURADO COMO LINGUAGEM

Atualizado: 1 de mar.

Lacan, em seu Seminário 11, seminário importante para o período em que ele está vivendo,  apresenta os quatro conceitos considerados por ele fundamentais para a psicanálise: o inconsciente, a repetição, a transferência e a pulsão. Aqui, neste pequeno resumo, irei abordar o inconsciente.

Um dos grandes axiomas de Lacan e de seu retorno a Freud é: “O inconsciente é estruturado como uma linguagem” (Seminário 11, p. 25); um aforismo de fundamental importância e conhecimento de todos que estudam sua teoria. Sempre que se diz sobre o inconsciente, essa frase aparece, contudo; o que essa máxima quer dizer? Como esse inconsciente é teorizado na obra lacaniana, qual a importância do conhecimento dessa estrutura na clínica psicanalítica? Embora ainda engatinhando na teoria lacaniana, vou me aventurar em fazer essa explanação.

Essa proposição fundamentada por Lacan, parte da síntese de várias referências teóricas, a exemplo de Ferdinand Saussure, Roman Jakobson, onde por meio da linguística estruturalista e do uso de suas ferramentas, Lacan teoriza sobre a estrutura do inconsciente. Para Lacan:


[...] a linguística, cujo modelo é o jogo combinatório operando em sua espontaneidade, sozinho, de maneira pré-subjetiva - é esta estrutura que dá seu estatuto ao inconsciente. É ela, em cada caso, que nos garante que há sob o termo de inconsciente algo de qualificável, de acessível, de objetivável. (LACAN, p. 28).


Como aponta Jorge (2005, p.65) Lacan, a partir do retorno a Freud, resgata sua especificidade e busca evidenciar, por meio dos textos freudiano, que a psicanálise opera pela via da palavra. Lacan considera alguns textos de Freud canônicos para pensar o inconsciente, sendo eles: A interpretação dos sonhos (1900), A psicopatologia da vida cotidiana (1901) e Os chistes e sua relação com o inconsciente (1905).

A contribuição de Jacques Lacan para a psicanálise, especialmente sua formulação do inconsciente estruturado como uma linguagem, representa uma transformação significativa na compreensão da teoria psicanalítica, especialmente na releitura que ele faz da obra freudiana. Lacan não busca seguir os conceitos de Freud, mas faz esse retorno para extrair da obra freudiana a sua essencia: a palavra como operador central.


Quando incito os psicanalistas a não mais ignorarem este terreno, que lhes dá um apoio sólido para sua elaboração, quer isto dizer que eu penso em manter os conceitos introduzidos historicamente por Freud sob o termo de inconsciente? Muito bem, não!, eu não penso assim. O inconsciente, conceito freudiano, é outra coisa[...] (LACAN, 2008, p. 28)


A centralidade da linguagem no pensamento de Lacan destaca-se como um avanço teórico marcante. Ao descrever o inconsciente como "estruturado como uma linguagem", ele propõe que os processos psíquicos são mediados pela linguagem, marcando uma distinção importante em relação às concepções anteriores do inconsciente.

A linguagem, para Lacan, não é apenas um meio de comunicação, mas um sistema simbólico que influencia a formação do sujeito. As palavras não apenas comunicam pensamentos, mas moldam a própria identidade e subjetividade do indivíduo. Dessa forma, o inconsciente, longe de ser um depósito caótico de desejos reprimidos, é concebido como um espaço estruturado por meio de símbolos e significados.


Chamo a atenção de vocês para a forma precisa como Lacan define o inconsciente, extraindo do conceito freudiano a sua radicalidade. O inconsciente não é uma mera cópia dos pensamentos e interesses do eu, guardada numa camada mais “profunda”, não é um duplo do eu. (TEIXEIRA, CODATO, 2022 p. 21)


Lacan lança luz sobre a complexidade das interações simbólicas e linguísticas que constituem a psique e como isso reflete na forma de pensar o sujeito, contribuindo para uma compreensão mais profunda das dinâmicas psíquicas e sociais. 

Essa perspectiva implica que as experiências emocionais, desejos e conflitos são moldados e articulados através de sistemas simbólicos. “O inconsciente é a soma dos efeitos da fala, sobre o sujeito, nesse nível em que o sujeito se constitui pelos efeitos do significante. (TEIXEIRA, CODATO, 2022, p. 33).  

Argumenta que a linguagem é o meio primário através do qual os sujeitos humanos simbolizam e representam suas experiências psíquicas. O inconsciente, segundo ele, não consiste em impulsos ou desejos brutos, mas em significantes e significados que são organizados de acordo com as estruturas linguísticas. Essa perspectiva destaca a importância da cultura, da linguagem e das relações sociais na formação da psique.

Lacan  introduz o conceito do "registro simbólico", que representa a dimensão linguística e simbólica da experiência humana. Destaca a importância da diferença entre o significante e o significado, referindo que os processos psíquicos ocorrem por meio de significantes que se relacionam uns com os outros de maneiras complexas.

Isto posto, entende-se que compreender a estruturação do inconsciente na teria lacaniana é fundamental, pois além de divergir das conceituações sobre o inconsciente elaboradas por Freud, faz um resgaste ao núcleo central da clínica psicanalíta: a palavra.

A teoria lacaniana do inconsciente oferece uma perspectiva rica e estimulante para a clínica psicanalítica, visto que somos constituidos pela palavra e o nosso inconsciente é estruturado pela soma do efeito dessas palavras sobre nós.

Na prática clínica, essa compreensão do inconsciente tem importância fundamental. O trabalho do analista se faz a partir da  linguagem, da escuta daquilo que é dito, silenciado, na forma como é contado e principalmente na escuta dos significantes daquilo que se diz.

A psicanálise lacaniana explora os nós, os nós que a palavra fez e faz em nós. As experiências emocionais, a forma como formos criados e inseridos na lingua refletem os conflitos psíquicos e os processos de simbolização. A forma como o sujeito se coloca em relação à palavra e como faz uso dela nos direciona para a escuta. Os padrões linguísticos, os lapsos, os chistes, a forma como o sujeito se estrutura sua organização simbólica. 

O entendimento da estruturação do inconsciente na perspectiva lacaniana se faz necessário e segue sendo atual. È de fundamental importância a constante relação da teoria com a prática, do retorno a leitura de Freud e do aprofundamento constante da elaboração teórica de Lacan, para compreendermos a clínica e o fazer psicanalítico a partir dessa perspectiva.


REFERÊNCIAS


CODATO, Valéria. Os quatro conceitos fundamentais. In: Fundamentos da psicanálise:teoria e clínica. Instituto de Ensino Superior em Psicologia e Educação (ESPE), 2023. Disponível em: https://espe.app.toolzz.com.br/play/player/53099923?escola_id=posgraduacao&aula=90321&conteudo=93382568&institution=espe&school=posgraduacao 


JORGE, Marco Antonio Coutinho.  Fundamentos da psicanálise de Freud a Laca, vol. 1: as bases conceituais. 2° ed, 12° imp. Rio de Janeiro: Zahar, 2005.


LACAN, Jacques, 1901 - 1981. Seminário, livro 11: os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. 2° ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.


LAPLANCHE, J; PONTALIS, J.B. Vocabulário da psicanálise. Trad: Pedro Tamen. 5° ed. São Paulo: Martins Fontes, 2022.


SAMICO, Fernanda. Inconsciente estruturado como linguagem. In: Fundamentos da psicanálise:teoria e clínica. Instituto de Ensino Superior em Psicologia e Educação (ESPE), 2023. Disponível em: https://espe.app.toolzz.com.br/play/player/53099923?escola_id=posgraduacao&aula=90321&conteudo=93382568&institution=espe&school=posgraduacao 


TEIXEIRA, M. R e CODATO, V. Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise comentados: inconsciente, pulsão, transferência e repetição. 1° ed. Salvador: Ágalma Associação de Psicanálise de Maringá Ato analítico , 2022.


AUTORIA GABRIELA MACIERA GAZITO.

TEXTO ELABORADO PARA O MÓDULO DE PÓS GRADUAÇÃO EM PSICANÁLISE.

DIREITOS RESERVADO AO AUTOR.







 
 
 

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